terça-feira, 24 de novembro de 2015

Yoko Ono (1933)

Yoko Ono (1933-)Ono 1.jpg

Yoko Ono nasceu no ano de 1933 na cidade de Tóquio,                           
Japão – país em que passou parte da infância juntamente
com os Estados Unidos (seu pai assumiu a direção de um banco no
estado de San Francisco). Já na infância Ono principiou a estudar
piano, composição e até canto lírico, frequentando renomadas
instituições como a Jiyu-gakuen Music School, no Japão.
Entretanto, no final dos anos 50 e começo dos anos 60, ao
ingressar na prestigiada Sarah Lawrence College, em Nova Iorque,
Ono estabeleceu o primeiro contato com a arte de performance e com
as tendências da vanguarda artística em geral. Ao longo dos anos 60,
após desvincular-se de sua família aristocrática, Yoko Ono
despontou como artista conceitual e performativa, compositora, cantora
e cineasta. Celebrando um experimentalismo marcante em todos
os seus diversos trabalhos, a artista ainda se uniu a grupos como
Fluxus, movimento criado por George Maciunas e norteado tanto por
provocativas contestações à arte canônica quanto por atividades
que exigiam uma efetiva interação com o público, a ponto de
elegê-lo como peça fundamental para a concretização da obra.
O movimento também prezava por uma intertextualidade
entre as diferentes modalidades artísticas: artes plásticas,Ono 2.jpg
música, cinema, teatro, dança. O vasto repertório de Yoko Ono acabou se alinhando de fato a essa proposta, seja por sua versatilidade em
diferentes meios de produção, seja pela maneira instigante com que
sempre convidou o público a interagir e mesmo a finalizar
a obra de arte. No final dos anos 60, Ono conheceu John Lennon,               
um dos principais vocalistas dos Beatles, e a inicial parceria entre os dois artistas culminou, por fim, em um duradouro (e polêmico)
relacionamento. Ao longo dos anos 70, Ono e Lennon investiram num
expressivo experimentalismo musical, bem como em instalações,
vídeos e performances de cunho conceitual – alguns destes relacionados à causa pacifista. Após o assassinato de John Lennon em 1980, Yoko Ono prosseguiu com sua carreira musical solo mais seus outros trabalhos envolvendo instalações conceituais e artes
plásticas.

Pensando uma relação com a causa feminista, o repertório
de Yono Ono destaca-se por pontuais vídeos, performances e canções que abordam, sobretudo, a questão do corpo feminino. Nestes trabalhos temos tanto a manifestação de um desejo de libertação Ono 3.jpg
desse corpo frente aos moralismos e tabus, como no vídeo “Freedom”, quanto a exposição do assédio agressivo que ele sofre no momento em que se encontra mais vulnerável ou exposto, como na renomada “Cut Piece” (performance em que, dispondo-se imóvel e neutra no centro de um tablado, a artista convidava os integrantes da plateia a subirem ao
palco e cortarem um pedaço de suas roupas cada um). Yoko Ono
também não deixou de se tornar mais um símbolo da hostilização à

mulher como criadora artística, ao ter o conjunto de sua obra desvalorizado devido ao relacionamento com John Lennon. Tornando-se um bode expiatório para o polêmico fim do conjunto musical dos Beatles, a artista até hoje carrega tal estigma, a ponto de toda sua história e legado serem praticamente desconhecidos em face a esse único episódio. Entretanto, a “maldição dos Beatles” ainda não impede Yoko Ono de se afirmar como uma artista autêntica e jamais limitada à sombra de John Lennon – basta lembrarmos que antes de conhecê-lo, ela já se estabelecia como expressiva representante de uma vanguarda revolucionária.

Rosana Paulino (1967)

Rosana Paulino (1967-)

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Rosana Paulino nasceu no ano de 1967, no bairro Freguesia do Ó, da cidade de São Paulo (aonde vive até hoje).Renovada gravadora, fez estágio no Ateliê de Restauro de Obras de Arte em suporte de papel do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC/USP) entre os anos de 1993 e 1995, além de frequentar, em 1994, a oficina livre de gravura no ateliê do Museu Lasar Segall. Em 1995, tornou-se bacharel em Gravura pela Escola de Comunicação e Artes da USP, e em 1998 especializou-se em gravura pelo London Print Studio, em Londres, por intermédio da Bolsa APARTES/CAPES.Por fim, entre os anos de 2006 e 2008, Rosana foi bolsista do Programa Bolsa da Fundação Ford, e em 2012 ainda fez uma residência no Tamarind Institute – Universidade do Novo México, Albuquerque, EUA – com apoio do Departamento de Estado Norte-americano. Atualmente, ela é doutoranda em Artes Plásticas
pela ECA/USP. Já participou de diversas exposições no Brasil,Paulino 2.jpg
assim como nos EUA, Chile, Bélgica, Holanda, Portugal e Espanha.
                                                                                                    
O trabalho de Rosana Paulino possui como principal temática as
diversas hostilidades contra a mulher negra no Brasil. Além da
opressão de gênero, portanto, a artista igualmente trabalha com
a problemática do preconceito racial, bem como com as demais
intolerâncias relacionadas a uma desigualdade social e mesmo
cultural e artística. De suas obras, destaca-se, primeiramente, a
criação de imagens altamente expressivas a partir da manipulação
de objetos do cotidiano – e sobretudo os vinculados ao âmbito
doméstico e associados, por consequência, a uma atividade
feminina (a artista trabalha, em especial, com instrumentos
ligados a costura, como linhas, tecidos e bastidores). Desse modo,
Rosana Paulino alinha-se a uma tendência da arte feminista (e mesmo da arte contemporânea como um todo) de se apropriar de
objetos e feituras artesanais (e neste caso, tidos como “essencialmente femininos”) para subverter, contestar ou provocar um cânone de produção artística mais os discursos e hierarquias latentes a esse cânone (e nessa tendência temos desde os trabalhos de artistas internacionais como Judy Chicago e Miriam Schapiro, Paulino 3.JPG
até as produções de artistas brasileiros como Lina Mena Barreto e Anna Maria Maiolino).Rosana Paulino também é associada a outra recente tendência artística (denomina story art) que preza pela articulação entre uma crítica social e histórica e uma experiência altamente subjetiva. A artista, no caso, alimenta-se de sua própria vivência como mulher negra e oriunda de uma família de poucos recursos para a formulação de críticas bastante incisivas às históricas estigmatizações e hostilidades contra o universo feminino e negro – e nisso temos desde a abordagem da agressão doméstica, em obras como a célebre série “Bastidores”, até uma reflexão sobre
a imposição de padrões de beleza às garotas negras,
como em “Baile”. Nisso, além de um genuíno ato de protesto
vinculado a uma memória, temos uma efetiva ação de
empoderamento artístico: em uma história da arte brasileira
na qual a mulher negra é abordada majoritariamente por
artistas homens ou, quando mulheres, brancos, com Rosana
Paulino temos a efetiva manifestação dessa mulher negra e sua
afirmação como contundente e expressiva artista.

Judy Chicago (1939)

Judy Cohen nasceu no ano de 1939 na cidade de Illinois,             
EUA. Com formação na Art Institute of Chicago e na University                       
of California, Los Angeles (UCLA), Judy passou a produzir suas
primeiras pinturas e esculturas já nos anos 60, atendendo,
primeiramente, a uma estética abstrata e minimalista
(conforme as principais tendências artísticas da época).
Entretanto, ao longo desta mesma década, seu trabalho foi se tornando, além de mais expressivo e pessoal, gradativamente menos abstrato e mais figurativo, a partir, sobretudo, da frequente evocação de símbolos e formas relacionados ao corpo feminino. Já no final dos anos 60, os trabalhos da artista encontram-se explicitamente vinculados ao feminismo, e esta nova fase tem seu marco simbólico
na escolha de Judy em ter um novo sobrenome, não vinculado
ao seu pai ou ao seu novo marido: ela agora passaria a se chamar Judy Chicago. Dos anos 70 em diante, a artista dedicou-se a uma série de expressivas instalações e projetos, a maioria dos quais
fortemente engajados na causa feminista – e o mais famoso
deles é “The Dinner Party”, instalação que homenageia e celebraChicago 2.jpg
importantes personalidades (ou mesmo entidades) femininas da
história da sociedade ocidental. E além de seus trabalhos como artista, Judy Chicago dedicou-se a programas educativos voltados ao incentivo e ao aprimoramento da aprendizagem feminina em produção artística,haja vista as condições ainda desiguais enfrentadas pelas mulheres no âmbito das artes. No início dos anos 70, ela mais a artista Miriam Schapiro fundaram na CalArts o primeiro programa acadêmico feminista, denominado Feminist Art Program – o qual, anos mais tarde, resultaria na criação da Womanhouse, famosa instalação e espaço de performance, dedicado à expressão artística feminina. Judy Chicago também se envolveu na fundação de instituições como a Through the Flower.

Judy Chicago destaca-se, portanto, por seu engajamento ao
devido reconhecimento da expressão artística e intelectual
feminina, em um sistema que ainda reflete a mentalidade de
uma sociedade patriarcal para a qual as mulheres não possuemChicago 3.jpg
as mesmas faculdades criativas que os artistas masculinos. Em sua
própria filiação com o figurativismo, nos anos 60, a artista já assumia
tal ativismo: em oposição a uma arte abstrata e minimalista, valorizada        
por uma classe intelectual majoritariamente masculina, Chicago abraça a figuração, evocando, inclusive, a imagem-tabu da genitália feminina,
tão rejeitada por uma produção artística ainda majoritariamente
voltada ao falo. Em trabalhos como “The Dinner Party”, Chicago
reage, portanto, à própria opressão de gênero recorrente no espaço
acadêmico, afirmando e celebrando o vasto legado intelectual,
criativo e cultural deixado por tantas mulheres ao longo da história – e
em outras de suas obras, a artista ainda valorizaria produções
artesanais e domésticas, como o bordado e a costura, historicamente
associadas à manufatura feminina e desvalorizadas justamente
por essa autoria. A produção e legado de Judy Chicago volta-se, desse
modo, à violência promovida pela própria história da arte (e, por consequência, pelo mercado de arte) em relação ao repertório igualmente valoroso de tantas mentes criativas, sensíveis e inteligentes.

Ana Mendieta (1948-1985)

    
Ana Mendieta nasceu no ano de 1948 em Havana, Cuba,
por onde viveu até os 12 anos de idade, quando foi exilada
para os EUA junto de sua irmã, em meio à Operação Peter Pan.
Mendieta estudou na Universidade de Iowa, onde se formou
em pintura no ano de 1972. Aluna de Hans Breder (grande amigo,
parceiro e influência), frequentou um dos primeiros cursos
interdisciplinares da instituição, o Programa de Artes Intermídia
(fundado e coordenado por Breder). O igual contato com grupos
como Fluxus garantiu a sintonização de Mendieta à vanguarda
artística dos anos 70, e é também nessa época que a artista estabeleceu
os primeiros (e duradouros) vínculos com o movimento feminista.             
Consolidando-se, ao longo dos anos 70 e 80, como artista de
performance e de earth-body-work (ou seja, de trabalhos com
os quais propõe uma interação entre o corpo e a natureza) – e
sempre em constante diálogo com outras modalidades artísticas
como a fotografia e o vídeo – Ana Mendieta teve um fim trágico
no ano de 1985, quando caiu do 34º andar do prédio onde
morava com seu marido, Carl Andre (renomado artista plástico,
ligado ao movimento minimalista). Até hoje especula-se se aMendieta 2.jpg
morte de Ana foi realmente provocada por um suicídio (os vizinhos       
alegam ter ouvido uma forte discussão entre ela e o marido
momentos antes do incidente). E a despeito das suspeitas e formais       
acusações, Carl Andre conseguiu ser inocentado pelos juízes
(medida excepcional considerando que casos como esse
costumam ser julgados por um júri).

A obra de Ana Mendieta encerra uma complexidade de traumas,
desejos, protestos e paixões. Em todos estes trabalhos, no entanto,
o corpo aparece como uma constante. Seja auto-deformado,
ensaguentado ou violentado, seja integrado à natureza por meio
da impressão de sua silhueta nos mais diversos ambientes
(ou seja até por meio de pequenas esculturas que remetem a
divindades femininas míticas), este corpo se faz presente numa
afirmação simultânea de seu padecimento e resistência. Ao mesmoMendieta 3.jpg
tempo em que sofre, física ou espiritualmente, por seu desamparo
(o trauma do exílio) ou por sua violação (a agressividade da sociedade     
patriarcal contra o corpo feminino), o corpo de Ana Mendieta ainda
deixa sua marca, expressão e manifesto. Em vez de silenciar suas
cicatrizes, a artista as escancara com base não apenas em um ato
de revolta, mas também numa genuína busca por uma espécie
de redenção face às diversas hostilidades que encontrou
ao longo de sua história (daí, inclusive, o caráter místico que permeia
boa parte de suas obras, bem como a constante dualidade
entre a vida e a morte). Torna-se ainda mais trágico, portanto, o
misterioso e terrível incidente que pôs fim à vida da artista, e justamente
no momento em que sua carreira começava a deslanchar – e as suspeitas
agressões de seu marido (o qual ainda uma figura mais prestigiada no mundo das artes do que a falecida esposa) não deixam de ecoar a persistente opressão machista que ainda fere, silencia e boicota tantos corpos, mentes e espíritos. No entanto, o legado de Ana Mendieta ainda é forte e evocativo o suficiente para prosseguir com seu ato de afirmação
e resistência, para além de qualquer violência – inclusive a da morte.
Foi na incisiva expressão de seu corpo vulnerável e forte
que Ana Mendieta conseguiu imprimir sua marca para a posteridade,

alcançando, desse modo, sua mítica redenção.