terça-feira, 24 de novembro de 2015

Ana Mendieta (1948-1985)

    
Ana Mendieta nasceu no ano de 1948 em Havana, Cuba,
por onde viveu até os 12 anos de idade, quando foi exilada
para os EUA junto de sua irmã, em meio à Operação Peter Pan.
Mendieta estudou na Universidade de Iowa, onde se formou
em pintura no ano de 1972. Aluna de Hans Breder (grande amigo,
parceiro e influência), frequentou um dos primeiros cursos
interdisciplinares da instituição, o Programa de Artes Intermídia
(fundado e coordenado por Breder). O igual contato com grupos
como Fluxus garantiu a sintonização de Mendieta à vanguarda
artística dos anos 70, e é também nessa época que a artista estabeleceu
os primeiros (e duradouros) vínculos com o movimento feminista.             
Consolidando-se, ao longo dos anos 70 e 80, como artista de
performance e de earth-body-work (ou seja, de trabalhos com
os quais propõe uma interação entre o corpo e a natureza) – e
sempre em constante diálogo com outras modalidades artísticas
como a fotografia e o vídeo – Ana Mendieta teve um fim trágico
no ano de 1985, quando caiu do 34º andar do prédio onde
morava com seu marido, Carl Andre (renomado artista plástico,
ligado ao movimento minimalista). Até hoje especula-se se aMendieta 2.jpg
morte de Ana foi realmente provocada por um suicídio (os vizinhos       
alegam ter ouvido uma forte discussão entre ela e o marido
momentos antes do incidente). E a despeito das suspeitas e formais       
acusações, Carl Andre conseguiu ser inocentado pelos juízes
(medida excepcional considerando que casos como esse
costumam ser julgados por um júri).

A obra de Ana Mendieta encerra uma complexidade de traumas,
desejos, protestos e paixões. Em todos estes trabalhos, no entanto,
o corpo aparece como uma constante. Seja auto-deformado,
ensaguentado ou violentado, seja integrado à natureza por meio
da impressão de sua silhueta nos mais diversos ambientes
(ou seja até por meio de pequenas esculturas que remetem a
divindades femininas míticas), este corpo se faz presente numa
afirmação simultânea de seu padecimento e resistência. Ao mesmoMendieta 3.jpg
tempo em que sofre, física ou espiritualmente, por seu desamparo
(o trauma do exílio) ou por sua violação (a agressividade da sociedade     
patriarcal contra o corpo feminino), o corpo de Ana Mendieta ainda
deixa sua marca, expressão e manifesto. Em vez de silenciar suas
cicatrizes, a artista as escancara com base não apenas em um ato
de revolta, mas também numa genuína busca por uma espécie
de redenção face às diversas hostilidades que encontrou
ao longo de sua história (daí, inclusive, o caráter místico que permeia
boa parte de suas obras, bem como a constante dualidade
entre a vida e a morte). Torna-se ainda mais trágico, portanto, o
misterioso e terrível incidente que pôs fim à vida da artista, e justamente
no momento em que sua carreira começava a deslanchar – e as suspeitas
agressões de seu marido (o qual ainda uma figura mais prestigiada no mundo das artes do que a falecida esposa) não deixam de ecoar a persistente opressão machista que ainda fere, silencia e boicota tantos corpos, mentes e espíritos. No entanto, o legado de Ana Mendieta ainda é forte e evocativo o suficiente para prosseguir com seu ato de afirmação
e resistência, para além de qualquer violência – inclusive a da morte.
Foi na incisiva expressão de seu corpo vulnerável e forte
que Ana Mendieta conseguiu imprimir sua marca para a posteridade,

alcançando, desse modo, sua mítica redenção.

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